Foi realizado nesta quinta-feira (28), no auditório da Secretaria Municipal de Educação, o 1º Seminário sobre TEA (Transtorno do Espectro Autista). O encontro foi promovido pela Academia de Educação de Feira de Santana, com apoio da prefeitura, e reuniu profissionais da saúde, educação, famílias atípicas e a comunidade em geral, fechando a Semana Nacional da Pessoa com Deficiência Intelectual e Múltipla, que começou no último dia 21.
O seminário reforçou a necessidade de diálogo contínuo entre famílias, profissionais e gestores para fortalecer políticas de inclusão, conscientização e defesa dos direitos das pessoas com TEA em Feira de Santana.
Mães compartilham experiências com o diagnóstico
O seminário trouxe relatos de mães que vivenciam o autismo na rotina familiar. Kamila Reis Andrade, mãe de Joaquim, de 5 anos, contou como foi o impacto do diagnóstico dele aos um ano e oito meses.
“Ele teve a curvatura dele toda normal, tranquila, ele andou com dez meses; falou a primeira palavra, que foi ‘vovô’; chamava ‘mamãe’. Porém, de um ano e sete meses, ele veio perdendo essas habilidades. Ficou uma semana sem chamar ‘mamãe’. Foi quando eu estranhei.”
Ela procurou o neurologista, que solicitou diversos exames antes de fechar o diagnóstico de autismo nível 2 de suporte. A família ficou abalada com o diagnóstico, mas encontrou forças para buscar o acompanhamento correto. Hoje, o autismo de Joaquim já progrediu.
“Ele saiu do nível 2; ele está entre mais para o 1, entre o 2, porque ele ainda tem algumas características dos dois. Ele saiu de uma criança não verbal para hoje uma criança verbal. Então, assim, quanto antes a gente observa e fica atento a alguns sinais, alguma coisa, deixe você ser chamada de louca, não importa, vá e procure. E o melhor de tudo, aceite. Porque, quando você aceita, tudo melhora, tudo se transforma”, afirmou.
Já Jocimeire dos Santos Conceição, mãe de Iago, de 21 anos, relatou os desafios enfrentados até a confirmação do autismo na adolescência. Os primeiros sinais foram observados aos 11 anos de idade. A família procurou a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), onde conseguiu fechar o diagnóstico aos 19 anos. Hoje, o jovem é um grande pintor, conhecido como Artista Fénix.
“A experiência, num primeiro momento, a gente perde o chão, mas consegue entender que, com a ajuda dos profissionais, pode-se obter uma evolução significativa. Então a gente, pais e mães responsáveis, não pode desistir e não pode parar. A luta continua. A gente tem que se engajar nessa luta. O diagnóstico não é o fim”, declarou ao Acorda Cidade.
Jocimeire destacou também o quanto a sociedade não é inclusiva o bastante. Os pais e responsáveis por pessoas com espectro autista sempre têm que estar atentos ao tratamento de seus filhos nos espaços sociais.
“A gente teve praticamente que começar a ensinar a escola como tratar nossos filhos. As escolas avançaram porque a família, junto com a escola, só tem a melhorar, então hoje a gente está vendo mais escolas inclusivas. Mas, no tempo da gente, há vários anos atrás, quando ele tinha 6, 7 anos, foi muito difícil”, relembrou.
Educação inclusiva como prioridade
A psicopedagoga e mestre em Educação Isabel Cristina Araújo Almeida, que palestrou no evento, ressaltou a importância do acolhimento escolar no ambiente educacional.
“Primeiro, é importante conversar com a família para entender como essa criança é. Se é verbal, se tem a comunicação funcional; o que ela gosta; qual o tempo que consegue ficar em sala de aula; quais os costumes e comportamentos de forma geral. Quando a criança chega na escola, aí a escola vai entender pelo viés da escola, fazer uma avaliação para poder construir um plano de educação para fazer a sua abordagem”, explicou.
Ela destacou ainda que os avanços na rede municipal de ensino de Feira de Santana têm melhorado bastante no incentivo à inclusão de crianças e adolescentes. Através da Lei Berenice Piana, nº 12.764 de 2012, que reconhece o autismo como uma deficiência, o estado tem buscado garantir o direito ao acesso à educação, ao trabalho, à proteção e à atenção integral à saúde.
“Hoje, inclusive, a responsável por essa área, Adriana Boulos, comentou que há mais de 900 mediadores com essas crianças. Então, cada criança que está nas escolas municipais tem um mediador. Isso já ajuda bastante a professora”, acrescentou.
Durante o seminário, a psicopedagoga apresentou recursos clínicos e escolares importantes, como a CAA (Comunicação Aumentativa e Alternativa), que propõe estratégias e ferramentas que incluem símbolos, imagens, gestos e dispositivos eletrônicos, usados por pessoas com autismo para expressar necessidades, emoções e ideias quando a comunicação verbal é limitada.
“A comunicação alternativa se usa, na verdade, em todos os ambientes. Falei da caderneta da criança; isso é muito importante que toda família saiba, pois através dela pode-se acompanhar o desenvolvimento da criança. E tem um testezinho que é padrão-ouro, que se chama M-Chat, que está ali na caderneta da criança, e através desse teste a família pode acompanhar e visualizar se existe um risco de autismo”, indicou.
Direitos das pessoas com autismo
O advogado Gil Fernandes, que também é pai atípico, defendeu a ampliação do debate para além do mês de abril e da Semana das Pessoas com Deficiência. Ele também contribuiu com o seminário.
“A primeira coisa é ampliar a agenda, o calendário, para falar sobre algo que é extremamente importante para toda a sociedade. Cerca de 2% da população brasileira tem TEA. E isso impacta a saúde, impacta a questão social e impacta a questão da educação”, pontuou.
Para ele, os direitos da pessoa com autismo precisam ser garantidos em três pilares: social, educacional e de saúde. Não dá para enfrentar o autismo sem ter uma abordagem multidisciplinar.
“Na parte social, com os benefícios sociais previdenciários; a implementação de políticas públicas de ensino pedagógico associadas à Lei Brasileira de Diretrizes e Bases da Educação, e também às leis que tratam sobre a pessoa com deficiência e do próprio autismo, que é a Berenice Piana; e os entendimentos dos tribunais superiores, além dessas leis federais, que garantem o direito de ter acesso a tratamentos multidisciplinares validados cientificamente para que possam evoluir e ganhar autonomia, o mais próximo possível de um cidadão autônomo”, reforçou.
Diagnóstico precoce e tratamento
O médico especialista em psiquiatria adulto-infantil Adriano Silva Oliveira também conversou com o Acorda Cidade. Ele destacou que o diagnóstico depende de uma avaliação criteriosa.
“O principal questionamento que temos é como chegar ao diagnóstico do autismo. Então, precisamos de uma entrevista clínica bem estruturada, uma avaliação bem criteriosa, para que nenhum detalhe passe despercebido, e para que consigamos chegar ao diagnóstico preciso e específico para aquele indivíduo”, explicou.
Ele ressaltou que os primeiros sinais podem ser identificados ainda nos primeiros meses de vida e afirmou que nem todos os médicos estão aptos a fechar um diagnóstico.
“Hoje em dia, conseguimos começar a suspeitar de autismo em uma criança de dois a três meses. Então, aquela criança vai para o seio da mãe e não olha nos olhos dela, não interage, se distrai com muita facilidade, tem um sono muito ruim, é muito agitada, e aí você já começa a pensar que isso pode estar acontecendo”, afirmou.
O psiquiatra também lembrou que, apesar do apoio medicamentoso, o principal tratamento está na terapia comportamental.
“O principal tratamento é baseado na teoria do comportamento ABA (Análise do Comportamento Aplicada – promove habilidades positivas e reduz comportamentos desafiadores, como os de crianças com autismo), que fornece estratégias e meios para que a criança possa desenvolver sua capacidade cognitiva, social, motora etc. Às vezes é necessário medicação, mas muitas vezes o que precisamos é fazer a rotina estruturada e fazer o básico bem feito”, completou.
Com informações do repórter Ed Santos do Acorda Cidade
Siga o Acorda Cidade no Google Notícias e receba os principais destaques do dia. Participe também dos nossos canais no WhatsApp e YouTube e grupo de Telegram.