Por Vladimir Aras
Agora que a greve da Polícia Militar acabou, podemos tratar de assuntos mais amenos. O tema é esporte. É como se o deputado federal José Mentor resolvesse desafiar de uma só vez Rodrigo Minotauro, Anderson Silva e Júnior Cigano para um confronto no campeonato brasileiro de MMA.
Autor do Projeto de Lei 5.534/09, Mentor quer proibir a transmissão das lutas de MMA pela televisão. Em caso de descumprimento, o infrator seria multado em 150 mil reais. A punição para a reincidência seria a cassação da concessão pública de teledifusão.
Riu, não foi? Não é mentira! Se ainda duvida, leia o inteiro teor do PL aqui.
Como conheço o deputado Mentor desde 2003, época da CPI do Banestado, na qual foi relator, diria que ele está na categoria dos pesos médios. Mesmo assim, ele resolveu encarar toda a turma peso pesado do MMA de uma só vez. Chamou todo mundo para o octógono para suar o paletó. Com direito a gravatas.
O ousado projeto proíbe as emissoras de televisão, canais abertos ou fechados, em todo o território nacional, de transmitir “lutas marciais não olímpicas.” Felizmente, a justificativa da proposição expressamente excepciona a capoeira. Já pensou? Estaríamos a um triz de voltar ao Código Penal de 1890 que criminalizava os capoeiristas:
Art. 402. Fazer nas ruas e praças publicas exercícios de agilidade e destreza corporal conhecidos pela denominação capoeiragem; andar em correrias, com armas ou instrumentos capazes de produzir uma lesão corporal, provocando tumultos ou desordens, ameaçando pessoa certa ou incerta, ou incutindo temor de algum mal:
Pena – de prisão cellular por dous a seis mezes.
Paragrapho unico. É considerado circumstancia aggravante pertencer o capoeira a alguma banda ou malta.
Aos chefes, ou cabeças, se imporá a pena em dobro.
Para o deputado, os confrontos de MMA são rinhas humanas. Como todos sabem, desde Getúlio Vargas (ou foi desde Jânio Quadros?), as rinhas de galo são proibidas no Brasil. Como então tolerar essas bestiais batalhas entre seres humanos? Este é o pensamento do autor do projeto, não o meu.
Pois bem. Acho que o PL 5.534/2009 não tem a mínima chance de ir para as finais, isto é, a ideia não tem preparo físico para suportar nem 15 segundos de pancada.
Creio que a iniciativa legislativa será derrubada já no primeiro round, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados. Se passar, toma um cruzado no queixo no plenário da Casa, onde o deputado Acelino Popó Freitas estará a postos. Outro deputado atleta, Romário, poderia ajudar dando uma bicuda para isolar o projeto, jogada que não era do seu feitio, reconheço.
Se conseguir mudar de categoria, o PL enfrentará os 81 do Senado. Não, o número está certo. Não são os Crazy 88. Caso supere todas as etapas do campeonato, seguirá para sanção presidencial. Como todos sabem, a presidente da República é boa de combate e pode querer terminar o projeto com um golpe chamado “veto total”. Segundo os estudiosos do direito desportivo, é o equivalente a uma joelhada voadora.
Se o projeto competidor não for eliminado em tal etapa, virará lei e a luta final será no tatame do STF, situado na Arena Three Branches Square. Na falta daquela ministra da família Gracie que deixou os ringues recentemente, para relator da causa eu escolheria Luiz Fux, o Doutrinador, ministro que veste o quimono da Academia do Rio de Janeiro.
O promotor do evento seria qualquer um dos legitimados à ação direta de inconstitucionalidade. Tem de ser uma direta mesmo, para um golpe concentrado e certeiro logo no caput da norma.
Na disputa, regida pelas regras da ADIn, o Dr. Fux que é sensei em processo civil e jiu-jitsu, já daria um soco giratório, seguido de um mata-leão na iniciativa do legislador e a resolveria em menos de minuto. Os demais juízes abririam contagem protetora no knockdown, e a Constituição seria aplicada, após umas poucas trocações efetivas, no chamado contraditório. Lembre-se, caro aficionado: no ringue do STF não “vale tudo”.
Ao cabo, o projeto do deputado Mentor seria finalizado com base na técnica denominada “artigo 5º” combinada com o golpe apelidado de “artigo 220”. Em inglês, idioma tradicional deste esporte, esse ataque coordenado é chamado de “civil rights armlock”.
Para ficar mais emocionante, a transmissão da sessão plenária do STF pela TV Justiça Desportiva ficaria a cargo do Galvão. Bueno, isto eu não sei se seria uma boa ideia.