Esse é o pássaro encantado que pousa na minha janela e me presenteia com um canto. Eu não posso aprisioná-lo, pois o canto do pássaro só existe porque ele é livre. O encanto está justamente no fato de não o possuir. Livre, ele consegue derramar na janela do quarto, a parcela de encanto que é necessário. O encanto alivia a existência…
Aprisionado, ela o possuía, mas não recebia dele o que ela considerava ser a sua maior riqueza: o canto! Amar talvez seja isso: Ficar ao lado, mas sem possuir. Viver também.
Precisamos descobrir que há um encanto nosso de cada dia que só poderá ser descoberto, à medida que nos empenharmos em não reter a vida. Talvez seja por isso que o verbo dividir nos ajude tanto no momento em que precisamos entender o sentimento da tristeza e da alegria. Eles só são suportáveis à medida que os dividimos… E enquanto dividirmos, eles passam, assim como tudo precisa passar.
Há encantos escondidos por toda parte. Presta atenção. São miúdos, mas constantes. Olhe para a janela de sua vida e perceba o pássaro encantado na sua história.
Escute o que ele canta, mas não caia na tentação de querê-lo o tempo todo só pra você. Ele só é encantado porque você não o possui. E nisto consiste a beleza desse instante: o tempo está passando, mas o encanto que você pode recolher será o suficiente para esperar até amanhã, quando o pássaro encantado, quando você menos imaginar, voltar a pousar na sua janela.
[O Caçador de Pipas]