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“Rala-bucho”, “forró” e “avexado”: confira as palavras do São João que você usa todo ano e não sabe a origem

Os festejos juninas vieram da Europa, trazidas pelos portugueses, que trouxeram com elas a quadrilha...

“Rala-bucho”, “forró” e “avexado”: confira as palavras do São João que você usa todo ano e não sabe a origem “Rala-bucho”, “forró” e “avexado”: confira as palavras do São João que você usa todo ano e não sabe a origem “Rala-bucho”, “forró” e “avexado”: confira as palavras do São João que você usa todo ano e não sabe a origem “Rala-bucho”, “forró” e “avexado”: confira as palavras do São João que você usa todo ano e não sabe a origem
Quadrilhas juninas
Foto: Divulgação/Fred Pontes e Reynaldo Felix

Por que as pessoas falam “balancê”, “avexado”, “bater coxa” e “anarrieêêêê!” quando o mês de junho chega? Essas expressões, que já viraram trilha sonora da memória afetiva nordestina, têm origem, história e até sotaque francês. Isso mesmo: os festejos mais nordestinos do país é uma mistura cultural que vem de longe. E para entender tudo, o Acorda Cidade bateu um papo arretado de bom com a professora de linguística Norma Almeida, da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs).

Segundo a professora, a resposta começa lá na França. Os festejos juninas vieram da Europa, trazidas pelos portugueses, que trouxeram com elas a quadrilha – uma forma de dança de origem francesa. Ao chegar ao Brasil, essa tradição europeia passou a dialogar com outras culturas, como a dos povos indígenas, segundo estudiosos da cultura popular, como Câmara Cascudo.

A mistura já começa aí. A quadrilha veio com passos franceses — e as palavras também. “Anarriê”, por exemplo, vem de en arrière (para trás), e “balancê” vem de balancer (balançar). Aqui no Brasil, essas palavras foram ganhando sotaque, ritmo e, claro, muito forró.

Professora de linguística da Uefs - ft ney silva acorda cidade - São joão - palavras usados no São João
Norma Almeida | Foto: Ney Silva/Acorda Cidade

“A gente tem palavras como avancer, anarriê, balancê, que são abrasileiramentos de palavras francesas. Claro que também existem palavras criadas aqui no próprio Brasil, como avexado, que é um brasileirismo, rala-bucho e outras”, completa a professora.

E se tem dança, tem música. O “forró”, aquele que dá todo tempero aos festejos juninos, também tem história, inclusive, a palavra traz polêmica entre os historiadores.

“Câmara Cascudo dizia que forró veio de uma palavra galega, porque antes de ser português foi galego-português. Mas a professora Yeda Pessoa de Castro coloca forró como de origem africana. De qualquer maneira, a forma de forró, nosso forró, é genuinamente nordestino”, afirmou.

Uma mistura que deu forró

A cultura junina é feita de misturas: de palavras, de ritmos, de tradições. Dos santos católicos à dança indígena, o Toré que arrasta o pé, da sanfona ao milho cozido, do licor de genipapo ao “arrasta-pé” na poeira das cidades, mas principalmente nos interiores do Nordeste. Tudo ali tem um porquê.

Festival de Quadrilhas em saj - São João
Foto: Luciano Almeida

“Antes mesmo dos cristãos já havia uma festa parecida, uma festa pagã. Cascudo também coloca que os indígenas tinham festas parecidas no mês de junho. Aqui no Brasil, mês de inverno, junho era importante para a cultura da mandioca, do milho, culturas inclusive que dão origem às comidas do São João”, explicou Norma.

Enquanto em Portugal o São João é comemorado com sardinha, aqui no Nordeste o cardápio é outro: mungunzá, pamonha, milho assado, laranja, amendoim e licor de genipapo. Tudo isso também traz marcas da cultura indígena e africana.

Alimentos típicos do São João
Foto: Paulo José/Acorda Cidade

“Mungunzá é uma palavra de origem africana, mas o milho é indígena. Provavelmente, tem a ver com quem é que fez a receita. O amendoim é indígena, é nosso. Genipapo, que é nosso, fez o nosso licor mais conhecido nas festas na maior parte do Nordeste”, comentou.

Viva a tradição, viva a renovação

As expressões típicas também evoluem. Assim como as roupas das quadrilhas, que hoje misturam o clássico com o contemporâneo, o vocabulário do São João também vai ganhando cara nova com o passar do tempo.

“A língua, na verdade, é viva, ela muda a cada geração. É importante manter a cultura popular, mas ao longo do tempo, os jovens vão inserindo novas expressões.”

Além disso, cada canto do Nordeste tem sua própria forma de celebrar e de se expressar. Em algumas regiões vai se falar que o forró é um “xaxado”, um “xote”. Tem o “avexado” aqui, “barrufado” ali, e por aí vai. Os sotaques e expressões mudam e podem significar coisas diferentes a partir das influências culturais.

Festejos milionários

Seja no sertão, no litoral ou na capital, a estrutura do São João gira em torno do “festejar”. Mesmo com a modernidade, as igrejinhas cenográficas, as barraquinhas, os balões e a quadrilha continuam sendo marcas registradas da festa.

São joão de Berimbau
Foto: Divulgação/Sergio Pedreira/ Ag. Fred Pontes

Mas o que antes era só tradição de roça, hoje movimenta cifras milionárias. Segundo o Ministério Público, até o início de junho, o Painel da Transparência dos Festejos Juninos da Bahia já havia recebido dados de 399 prefeituras — o equivalente a 95,5% das cidades do estado. No total, foram divulgadas 2.502 apresentações, com 1.108 artistas contratados. O valor investido: cerca de R$ 395 milhões.

“A festa junina se organiza, digamos assim, em torno do forró. O forró, na festa junina, se dança a quadrilha, se toca o forró, se toca o xote, se toca o baião, e se dança a quadrilha. Então, a festa se organiza em torno de um arraiá. Além, claro, das questões religiosas. Mas a parte profana, de certa forma, extrapolou a questão religiosa e caminham, às vezes juntas, às vezes separadas”, explicou.

No final das contas, o São João é isso mesmo: um grande caldeirão cultural. Veio da Europa, se enraizou no Brasil, encontrou as sabedorias indígenas e africanas, e floresceu como uma das maiores expressões da cultura brasileira.

🌽🪗 Confira algumas palavras para você ficar “sabido” durante dos festejos

  1. Arraiá – Nome carinhoso para a festa de São João. Pode ser na praça, na escola ou no quintal de casa.
  2. Balancê – Do francês balancer (balançar). Comando na quadrilha para os casais dançarem balançando.
  3. Anarriê – De en arrière (para trás). Significa que os pares devem ir de costas, cada um pro seu lado.
  4. Alavantú – Vem de en avant (para frente). É o passo de avançar na dança da quadrilha.
  5. Bate-coxa – Quando os pares dançam bem coladinhos, no embalo do forró.
  6. Avexado – Apressado, agoniado.
  7. Rala-bucho – Forrozão animado que faz suar a barriga: “Rala-bucho a noite inteira até o sol rair”
  8. Arrasta-pé – Um tipo de forró que se dança com o pé arrastado no chão
  9. Mungunzá – Prato junino feito com milho cozido, leite de coco ou açúcar. Uma delícia!
  10. Licor – Bebida tradicional feita com frutas como jenipapo, maracujá e amendoim. Pra quem curte uma bebida alcoólica, nos festejos não podem faltar.
  11. Fogueira – Elemento central da festa, em homenagem aos santos juninos.
  12. Pega-pinto – Corrida divertida em que as crianças tentam pegar um pintinho ou prêmio.
  13. Forró – Ritmo do São João. Inclui xaxado, baião e xote — pra dançar agarradinho ou soltinho.
  14. Quadrilha – Dança tradicional com pares, passos marcados e o famoso “casamento matuto”.
  15. Sabido – Inteligente
  16. Cabra – pessoa, homem
  17. Pau-de-sebo – Brincadeira em que se tenta subir num mastro escorregadio pra pegar o prêmio.
  18. Matuto – Pessoa do interior. No São João, todo mundo vira matuto com orgulho.
  19. Sim sinhô / Sim sinhá – Expressões usadas na quadrilha, lembrando o jeito carinhoso e respeitoso do interior.
  20. Xote – Ritmo dançante do forró, mais lento e gostoso, pé com pé.
  21. Baião – Ritmo nordestino criado por Luiz Gonzaga, com sanfona, triângulo e zabumba.
  22. Noivo fujão – Personagem clássico da quadrilha, que tenta escapar do casamento.
  23. Furdunço – Bagunça boa e animada, típica do São João no interior.

Com informações do repórter Ney Silva do Acorda Cidade

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