Solar Santana
Foto: Arquivo Pessoal

A escritora Vera Passos Coqueiro, filha de Milton Passos, proprietário do histórico Hotel Solar Santana, está escrevendo um livro para resgatar as ricas memórias de um dos casarões mais tradicionais de Feira de Santana. O imóvel, que era localizado na Avenida Senhor dos Passos, próximo à Casa de Saúde Santana, além de ter sido uma residência da família de Vera, também foi um marco na cidade como hotel, especialmente nas décadas passadas.

Vera, que atualmente mora em Salvador, tem buscado histórias que envolvem o antigo casarão para enriquecer sua obra, intitulada “Memória Solar”. A escritora recorreu ao Programa Acorda Cidade para pedir a colaboração de moradores e antigos frequentadores, na esperança de que suas histórias pessoais sobre o Solar Santana ajudem a dar vida ao livro.

“O Solar Santana foi residência da família Cunha, da minha mãe, e depois passou a ser de minha família, após o casamento de meus pais. As minhas memórias desse local são muito importantes e gratas, coisas muito boas de recordar”, disse a escritora em entrevista ao Programa Acorda Cidade.

Solar Santana - escritora Vera Passos
Vera Passos | Foto: Divulgação

Ela detalhou que seu pai, Milton José Passos (irmão de Vicente Passos), comprou a parte dos irmãos de sua mãe, Maria Célia Cunha Passos, e transformou a construção no hotel.

O Solar Santana, que chegou a ser “o melhor hotel de Feira” por ser o único a ter garagem, carrega memórias afetivas profundas para a escritora. No entanto, a história do casarão não teve um fim feliz. Após o falecimento trágico de seu pai, quando ela tinha apenas 17 anos, ela conta que o hotel foi vendido para outro proprietário, que, infelizmente, fez com que a construção fosse demolida.

“Quando houve o interesse de que fosse tombada a construção, o novo dono implodiu o casarão no meio da noite. Quando eu soube disso, eu fiquei chocadíssima. Durante algum tempo, quando eu ia em Feira, que eram oportunidades muito raras, eu virava o rosto para o outro lado para não ver.”

Ela lamentou a perda de um patrimônio que “foi uma construção belíssima, tinha afrescos, tinha uma capela dentro do hotel, não sei se as pessoas lembram, mas tinha uma fonte na frente, um gradil maravilhoso, inclusive, era tão bonito esse gradil, que Raimundo Pires, um arquiteto muito conhecido de Feira, comprou esse gradil. Ele tem na casa dele portas que estavam nos escombros dessa implosão. Poderia ter um valor enorme, poderia ser uma coisa transformada num museu para guardar a memória da cidade. Ao contrário, foi apagada por conta da ganância imobiliária”, disse ao Acorda Cidade.

Solar Santana
Foto: Arquivo Pessoal

Histórias afetivas de coragem

Vera começou a escrever desde jovem, mas publicou seu primeiro livro aos 61 anos. De lá pra cá, não parou mais e já lançou seis livros em cinco anos.

Este novo título, não será focado apenas nas vivências da família Passos-Cunha, mas busca ter “utilidade pública” e “causar encanto para as pessoas ao lerem”. A escritora já coletou histórias de familiares e, por um acaso, encontrou uma história belíssima de um senhor que conheceu em uma visita ao cemitério. Ele já havia se hospedado no hotel, o que a inspirou ainda mais a buscar outros depoimentos.

“Fiquei tão tocada com aquela história, que eu escrevi e mostrei para ele. Aí me veio a ideia de coletar outras. Se por um acaso essa [história] tinha esbarrado em mim, então certamente havia outras pessoas que viveram alguma experiência relacionada não só com o hotel, mas com a construção. O que é mais difícil é conseguir histórias dessa época, porque já tem bastante tempo, mas pode ser que alguém tenha uma história que um avô contou, que um pai contou, e eu acho que vão enriquecer o livro.”

Solar Santana - escritora Vera Passos
Vera Passos | Foto: Divulgação

Como exemplo do tipo de história que procura, Vera compartilhou um episódio marcante protagonizado por sua mãe, Maria Célia, que demonstrava uma coragem incomum para a época. Vera também possui várias poesias sobre o Solar Santana.

“Meu pai viajou para a fazenda perto de Santa Bárbara, de manhã e minha mãe ficava observando ele dirigir. Um dia, quando ele foi para a fazenda, tinha um leiteiro que chegava com o caminhão e deixava o leite lá no hotel. Meu pai tinha uma Rural [veículo]. Aí minha mãe chamou esse leiteiro, pediu a ele que tirasse o carro debaixo das árvores e o colocasse na porta. Ela chamou a irmã dela, Rosário, que morava com ela, era adolescente. Colocou os três filhos, eu sou a mais velha: Vera, Vânia e Milton, e saiu dirigindo na Rural, só que ela nunca tinha ligado um carro. Então ela saiu com esse carro pulando, pulando, na cidade de Feira. Foi até a casa de Zoraide e falou: ‘Luiz, por favor, me ajude aqui, por que essa pinóia está pulando tanto?’ Ele disse: ‘Você deve estar na marcha errada.’ Aí ele entrou no carro e eles ficaram rodando o dia todo para ela aprender a dirigir. Quando ela chegou em casa, meu pai estava fazendo a barba. Então ela pegou a chave, entregou para ele e disse assim: ‘Toma aqui, seu carro, sua mulher e seus filhos, todos intactos'”, relembrou emocionada.

Como contribuir com o livro

A busca por histórias já está rendendo frutos. Durante a entrevista ao Acorda Cidade, a produção do programa recebeu contatos de ouvintes com informações sobre ex-funcionários, como a avó da policial militar Patrícia Sales, que foi cozinheira do hotel (Dona Angelina), e Renato e Roque, que foram choferes (motoristas). A escritora mencionou ainda que se recorda de outros funcionários como uma camareira com nanismo e o garçom Osvaldo.

“Tinha uma senhora que tinha nanismo, que era camareira. Você imagina uma camareira cheia de lençóis no braço, cuidando dos quartos, cheirando anis. Eu me lembro do cheiro dela, me lembro do cheiro do quartinho dela, de pó de arroz, sabe assim? Mas essas pessoas, não sei se já faleceram.”

“Tem a família Oliveira, cujo pai, seu Antônio, já falecido, foi gerente de lá também. Eles moraram nessa mesma casa que eu morei. Eu tenho certeza que tem muita gente que tem memórias”, completou.

Vera ainda afirmou que “o que eu mais quer” é o contato com ex-funcionários e pessoas que viveram experiências no local. Ela deixou claro que os colaboradores não precisam necessariamente escrever as histórias.

“A pessoa não precisa escrever. Se ela quiser escrever, ela faz isso porque vai dar sua marca, o seu estilo literário. Mas como a maioria das pessoas preferiram, o que elas fizeram foi conversar comigo, gravar um áudio. Eu escrevo a história, eu narro dando um estilo que se aproxima mais da forma como eu concebi o livro. Mando pra ela, ela me pede os ajustes, diz o que precisa ser corrigido, eu mando de novo, até que esteja de uma forma que ela considere ideal e que ela autorize a publicação”, explicou.

Quem quiser compartilhar memórias sobre o antigo Solar Santana pode entrar em contato com a escritora pelos seguintes canais:

Instagram: @verapassoscoqueiro

E-mail: [email protected]

Siga o Acorda Cidade no Google Notícias e receba os principais destaques do dia. Participe também dos nossos canais no WhatsApp e Youtube e grupo de Telegram.