Rachel Pinto
Maiane de Araújo Souza não imaginava tantas mudanças em sua vida e não sabia o tamanho de sua força e do seu amor até a chegada do seu filho Davi. Casada há cinco anos, mãe de outra criança, trabalhando e em um emprego estável, tudo acontecia normalmente na vida da jovem, até o resultado do diagnóstico do filho: Microcefalia.
Depois de 30 dias de vida, o pequeno Davi foi diagnosticado com microcefalia. Uma condição neurológica rara em que o bebê nasce com o crânio menor do que o normal. Quando o perímetro da cabeça é igual ou menor do que 32 cm e as crianças podem apresentar dificuldades no desenvolvimento motor e intelectual. Nos últimos tempos, essa condição tomou uma grande proporção em todo o país, associada principalmente aos casos de Zika vírus, doença transmitida pelo mosquito Aedes aegypti.
Até então, Maiane nunca tinha visto outra criança com a mesma condição e o choque começou a partir da descoberta e das novas situações que a vida começou a apresentar. Logo veio a separação, o fim do casamento de cinco anos e as primeiras dificuldades de falta de conhecimento sobre a microcefalia, o medo e a vontade de esconder o filho, tomaram conta da mãe que não sabia o que fazer e entrou em depressão.
“Não sabia que o meu filho tinha microcefalia. Então quando eu descobri depois de 30 dias dele nascido eu tomei um choque. Meu mundo caiu. Minha família tomou um choque e veio a minha separação depois de cinco anos de casada. O pai do meu filho me abandonou porque não aceitava e foi muito difícil. Eu não sabia o que fazer, nem aonde ir. Eu queria esconder o meu filho da sociedade, de todos. Deixei de trabalhar, não saía mais de casa e queria desistir de tudo”, contou.
Sem saber como enfrentar a nova situação, foi na angústia e no desespero que ela buscou forças para lutar e resolveu mudar de atitude. “Um certo dia eu ouvi uma pessoa dizer para mim que meu filho parecia um monstro. Daí então eu disse: Meu filho não é um monstro, ele tem microcefalia e eu não aceito que ninguém o rejeite”.
O instinto de proteção da mãe somou-se então à luta para combater o preconceito contra a microcefalia, a busca por mais conhecimentos e a necessidade de se juntar a outras mães que estavam passando pela mesma situação. Maiane criou então um grupo no aplicativo de conversas WhatsApp e encontrou outras mães em Feira de Santana com filhos que tem microcefalia.
“Eu pensei: quero acabar com o preconceito porque só tem filho com microcefalia quem Deus escolheu. Nós somos privilegiadas por ter um bebê com microcefalia. O meu filho foi o primeiro a procurar a Secretaria de Saúde e eu o chamo de mascote, porque nós incentivamos outras pessoas a procurarem ajuda”, disse.
Feliz em ter despertado coragem e força para lutar contra as dificuldades, Maiane hoje enxerga Davi como uma benção de Deus e o seu grande guerreiro, assim como o Davi da história bíblica. “Primeiro quem tem que aceitar os nossos filhos somos nós. Nós achamos que não temos força, mas Deus dá força a gente para a gente vencer. Hoje eu estou aqui para dizer eu sou a prova viva de tudo que eu passei. Sei que não é fácil, mas todo mundo vence. Porque nossas crianças são especiais pra nós e pra Deus. Nós somos os escolhidos porque somos fortes,” relatou.
O encontro com outras mães
A partir da iniciativa de reunir outras mães no aplicativo de conversas e com o apoio da Secretaria Municipal de Saúde, foi realizado na manhã desta quarta-feira (23) no auditório do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), em Feira de Santana o 1º Encontro de Mães de Bebês com Microcefalia. Participaram diversas mães e profissionais das áreas de psicologia, assistência social e nutrição. O evento promoveu a troca de experiências e apresentou os serviços prestados pelo município.
A secretária de saúde Denise Mascarenhas informou que tanto a Secretaria de Saúde, como a Secretaria de Desenvolvimento Social estão empenhadas em oferecer o melhor atendimento às famílias. O encontro teve como objetivo aproximar todas as pessoas e apresentar o trabalho multiprofissional desenvolvido pelo município.
“Já temos a parte diagnóstica e nós já estamos organizando para que possamos fazer a parte assistencial. Vamos prestar os devidos cuidados. É um atendimento multiprofissional que envolve tanto fisioterapeuta, médicos, enfermeiros, nutricionistas, psicólogos e demais profissionais. Na saúde as coisas só funcionam se trabalharmos em equipe, não podemos olhar o usuário e fazermos uma parte individual. Nós temos que fazer essa ação conjunta. Com certeza vamos aos poucos nos organizando. É importante agora pensarmos na questão assistencial. Vamos buscar dentro do município algo que venha formatar mais essa assistência e dar mais qualidade de vida a essas mães e as crianças”, destacou.
Troca de experiências
Uliana Oliveira é mãe de Caio de sete meses. Ele ainda não foi diagnosticado com microcefalia, mas há suspeitas. Segundo Uliana, ele está sendo acompanhado por profissionais e realizando exames para que haja um resultado preciso do diagnóstico. Segundo ela, o bebê tem uma rotina normal e o encontro foi um momento de troca de experiências com outras mães.
“Caio não foi diagnosticado. Ele está com uma suspeita, porém a médica disse que será investigado. Está fazendo o os exames. A rotina é normal, a única diferença é que saímos muito para o médico”, pontuou.
Isabela Cristina Almeida disse que nunca esperava que tivesse uma filha com microcefalia. Mãe de outras duas crianças sem a doença, ela contou que jamais imaginava que pudesse acontecer com ela. A mãe teve Zika Vírus no segundo mês de gestação de Maria Vitória que nasceu com a condição de microcefalia e trouxe, além da superação, mais amor para toda a família. “A palavra é superação. Porque pra mim que tenho dois filhos sem a doença eu nunca esperava que fosse acontecer comigo. Quando eu soube que ia ter uma criança que precisaria muito de mim eu pensei que não seria capaz, mas quando ela nasceu eu vi que sou capaz de amá-la e fazer mais coisas por ela que eu não pensava”, disse.
Segundo Isabela, cuidar da filha às vezes é um pouco trabalhoso porque é um aprendizado diário e é uma fase de conhecimento e entendimento de tudo. Maria Vitória apresenta algumas dificuldades motoras, mas aos poucos com o trabalho da fisioterapia tem melhorado. Às vezes ela fica nervosa e agitada, mas com todo amor e carinho a mãe a acalenta e a deixa bem segura e tranquila. É no colo de Isabela que ela se aconchega e adormece. “A gente vai vivendo o dia-a-dia, aprendendo e tentando entender também. Ela tem um pouco de dificuldade nas pernas, são um pouco duras; está fazendo fisioterapia e está melhorando. Às vezes ela fica nervosa, mas ai eu pego, acalento e ela fica bem tranquila”.
Ainda na fase de conhecimento sobre a microcefalia e dos apendizados diários, Isabela também já procurou a Previdência Social para solicitar o benefício social para Maria Vitória. A criança precisa de cuidados especiais e segundo a mãe o processo está sendo encaminhado, assim como a documentação para o requerimento.
Apoio Social
Manuela Tavares, assistente social da gerência da Previdência Social de Feira de Santana, explicou que o Benefício de Prestação Continuada (BPC) é um programa que integra o Sistema Único de Assistência Social (Suas) e garante uma renda mensal de um salário mínimo para pessoas com deficiência ou idosos acima de 65 anos. Para que o benefício seja adquirido é necessário que o diagnóstico seja confirmado através de um relatório médico e de uma série de documentos pessoais dos pais e da criança.
O procedimento é feito através da Secretaria de Desenvolvimento Social ou do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas). Ela informou que o município tem dado atenção aos casos de microcefalia para que as crianças possam ter uma melhor qualidade de vida e um melhor desenvolvimento.
“Por se tratar de uma questão de saúde pública, a microcefalia precisa de uma estimulação precoce para que o desenvolvimento dessas crianças ocorra de uma forma mais natural. Estamos tentando buscar as crianças e agilizar o atendimento”, ressaltou.
Cuidados especiais
Segundo a Secretaria Municipal de Saúde e a Vigilância Epidemiológica, 13 crianças foram diagnosticadas com microcefalia em Feira de Santana. Estas crianças precisam de atenção e cuidados especiais dos profissionais de diversas áreas como: médicos, fisioterapeutas, psicólogos e nutricionistas. O bom atendimento vai garantir um melhor desenvolvimento das crianças e a possibilidade de uma vida mais saudável.
A nutricionista Rita de Cássia Paz, da Secretária Municipal de Saúde, responsável pela orientação das mães das crianças com alergia alimentar e bebês com microcefalia que apresentam alergia alimentar, reforçou que as crianças precisam de uma alimentação diferenciada e uma boa nutrição. A amamentação até os seis meses de vida é fundamental, principalmente pelo fortalecimento do sistema imunológico e prevenção de doenças.
“São crianças que precisam de uma alimentação bem diferenciada. Orientamos aqui manter a amamentação para que as crianças estejam fisiologicamente preparadas para receber novos alimentos em um momento oportuno”, completou.
Após o 1º Encontro de Mães de Bebês com Microcefalia a proposta é que sejam realizados outros momentos de discussão e trocas de experiências. O encontro é uma oportunidade para apresentação das histórias de vida, das dificuldades, sentimentos e principalmente da quebra de barreiras e preconceitos.
Com informações e fotos do repórter Ney Silva do Acorda Cidade