
O escritor feirense Juan Glavemburgo acaba de conquistar um feito que o coloca entre os grandes nomes da literatura brasileira: ele é finalista do Prêmio Jabuti 2025, o mais tradicional e prestigiado prêmio literário do país. Natural de Feira de Santana, o autor celebra a conquista como um reconhecimento não apenas pessoal, mas também da potência criativa que nasce no interior da Bahia. O jovem foi indicado com o livro Marefasto, pelas editoras Flyve, Voe/Algoz, na categoria juvenil.
De cara, a sinopse do livro traz um spoiler em um mergulho poético e sombrio na mente de um adolescente que se isola em seu quarto por cinco dias, confrontando lembranças, dores e a lenta decomposição da realidade. Narrado por diferentes perspectivas, o livro expõe as fragilidades de uma família com problemas de relacionamento e pela depressão, conduzindo o leitor por um labirinto de angústias, fé e sobrevivência.

Ao Acorda Cidade, o escritor contou detalhes de como descobriu a indicação e descreveu o momento como um misto de sentimentos.
“Eu fiquei congelado, completamente anestesiado e achei que estava tendo um pensamento delirante. Para minha sorte, era verdade, eu era finalista. Mas eu cogitei seriamente ir ao psiquiatra. Receber a indicação de finalista com um livro tão visceral como Marefasto foi um anúncio de exposição, foi como colocar minhas fissuras num museu público.”
A trajetória de Juan é atravessada por temas como a fé, a ruína da condição humana e a poesia. Seu olhar literário nasce da experiência com o sertão, sua terra natal, do contato com as limitações sociais e espirituais que também moldaram a sua vida em Feira de Santana.

“Feira de Santana inspirou a construção da cidade fictícia Nova Jerusalém, mas para além do território geográfico o que me alfinetou a alma foi pensar nos meus ciclos de depressão e tentativas de suicídio e como eu não conseguia elaborá-los por conta que minha família, meus conhecidos e amigos não tinham acesso ao atendimento de Saúde mental, era algo que se resolvia pela fé, era uma crença de recorte geográfico-sócio-cultural. Então foi a partir desse lugar que os temas me atravessaram e germinaram em ideias para o livro”, revelou.
Ele explicou que sua escrita brota de um lugar de sinceridade e dor, mas também de resistência. “Acredito que o diferencial parte da semente viva de experiências vividas a partir da realidade das coisas. Há dores que só podem ser descritas se forem vividas. Então há muita verdade sobre adolescência e depressão de maneira nua e crua, assim como ela é no mundo real; assim como eu também experienciei.”
Entre o espelho e a página
Apesar do reconhecimento, Juan se vê em constante busca. A cada novo texto, revisita suas próprias dúvidas e certezas. Com muita modéstia, ele disse ao Acorda Cidade que ainda não se considera um escritor consolidado.
“Sendo bem honesto, eu ainda não me considero firmado como escritor. Sempre penso que estou numa jornada eterna de entender o que é essa vocação e carreira do fazer literário. Se eu pudesse responder sua pergunta de maneira assertiva, eu diria que o espelho é meu maior desafio todos os dias, meu espelho e minha consciência. Me olhar nos olhos e perguntar: Eu realmente quero ser escritor hoje? Às vezes me obrigo a responder um sim, às vezes nem preciso”, confessou.

Durante a entrevista, Juan apresentou uma honestidade nas respostas que para ele, são o reflexo de uma escrita que dialoga com o sofrimento humano, mas sem glamourizá-lo. É a vida sendo o que é.
“Eu não acredito que a dor seja necessária para se fazer Arte, no entanto, a dor é inevitável à condição humana. Tendo isso em vista, a minha matéria-prima é o sofrimento psíquico, a indecência da miséria e da ruína humana, assim como demandas sociais que me angustiem.”
Da Princesa do Sertão para o mundo
Para Juan, chegar ao Jabuti é uma vitória que ultrapassa fronteiras pessoais. É uma conquista coletiva, que ecoa o poder da literatura nordestina. “Significa alcançar um lugar que eu pensei que nunca alcançaria, um lugar que só o maior Prêmio de Literatura do Brasil poderia me dar, a validação da qualidade da minha obra e a certeza do potencial que a minha escrita tem.”
Todavia, ele afirma que esse “sucesso” é uma grande crença dele, completamente equivocada. Para ele, a obra possui sua qualidade literária em si, independente do reconhecimento do prêmio.
Ele também reconheceu que a literatura nordestina vive um momento de expansão, mas reforçou que essa conquista é fruto do esforço coletivo dos próprios autores da região.
“O próprio Nordeste construiu suas pontes e suas ferrovias e digo ferroviais por que conheço inúmeros colegas escritores que sequer pensam na possibilidade real de publicar. Isso se dá talvez por conta dos espaços, eventos e editoras estarem distantes; assim o diálogo fica lentamente arrastado em ferrovias construídas por palavras, mas sem grande efetividade e eficácia no âmbito interrelacional. Temos grandes exceções, isso é certo, acredito que agora eu mesmo seja um destes”

Ao se tornar finalista do Jabuti, Juan Glavemburgo abre caminhos para novas vozes que, como ele, surgem das margens e resistem pela palavra. “Definitivamente ser finalista de um prêmio como o Jabuti pode abrir inúmeros horizontes de possibilidades e eu estou aqui de braços abertos para que o mundo editorial possa me ver pela qualidade da minha obra e não apenas pelo recorte categorial do lugar de onde eu venho, a quantidade de livros que publiquei ou quantas rugas eu tenho no pescoço.”
Entre influências de Clarice Lispector, Fernando Pessoa e Bukowski, o escritor segue inquieto, criativo e incansável. “Eu não consigo parar de escrever. Estou sempre desenvolvendo alguma coisa. Mas a certeza nunca é certa se será uma ideia engavetada ou mais um grito para o mundo.”
Com informações da produtora Daniela Cardoso do Acorda Cidade
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