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Imagem ilustrativa | Foto: Silvio Tito/ Arquivo

Uma lei de autoria do vereador Edvaldo Lima gerou polêmica entre entidades que representam professores, pais e estudantes após ser sancionada pelo prefeito José Ronaldo de Carvalho na última terça-feira (11). A Lei Municipal nº 4.353 autoriza o uso da Bíblia Sagrada como material de apoio complementar nas escolas públicas e privadas de Feira de Santana.

De acordo com o texto publicado no Diário Oficial do Município, o uso da Bíblia está autorizado exclusivamente com fins culturais, históricos, geográficos, literários e arqueológicos. A norma permite a utilização da Bíblia em projetos pedagógicos nas áreas de História, Literatura, Filosofia, Ensino Religioso, Artes, Geografia e Arqueologia.

Lei que autoriza o uso da Bíblia em escolas
Foto: Diário Oficial do Município

O artigo 3º estabelece que a inclusão de conteúdos bíblicos será facultativa, respeitando a liberdade de consciência e crença de alunos e professores, e que a participação em atividades relacionadas não será obrigatória. A lei também assegura às instituições de ensino autonomia didático-pedagógica para decidir sobre o uso ou não da Bíblia nos projetos escolares.

Após a sanção, a APLB Feira de Santana e a Associação dos Docentes da Universidade Estadual de Feira de Santana (Adufs) divulgaram notas públicas de repúdio à medida.

A APLB argumenta que a lei fere o princípio da laicidade do Estado, garantido no artigo 19 da Constituição Federal, e representa um risco à neutralidade religiosa nas instituições de ensino. Segundo a entidade, a escola deve ser um espaço de respeito à diversidade e o uso de um único símbolo religioso pode invisibilizar outras tradições de fé e marginalizar estudantes e profissionais que não compartilham da mesma crença.

A nota também destaca dados do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) que apontam crescimento de mais de 80% nos casos de intolerância religiosa no país em 2024, com destaque para ataques às religiões de matriz africana. A entidade defende que a lei seja revogada, reforçando o compromisso com uma educação pública, laica e democrática.

A Adufs, por meio do seu Grupo de Trabalho de Política de Classe para Questões Étnico-Raciais, de Gênero e Diversidade Sexual (GTPCEGDS), também classificou a sanção como um “ataque à laicidade do Estado”. A associação afirma que a institucionalização da Bíblia como recurso didático contraria princípios constitucionais e pedagógicos voltados à pluralidade.

Em nota, a Adufs ressalta ainda que a aprovação ocorre em um contexto de crescimento do fundamentalismo religioso nas políticas públicas e que a medida pode gerar exclusão de pessoas que não professam a fé cristã.

A lei nº 4.353/2025 já está em vigor. Leia as notas de repúdio na íntegra:

Nota de repúdio contra a sanção da Lei nº 4.353/2025 que autoriza o uso da Bíblia nas escolas

A APLB de Feira de Santana, entidade que historicamente defende a educação pública, laica, gratuita e de qualidade, vem a público manifestar seu repúdio a Lei nº 4.353/2025, aprovada e sancionada em 10 de novembro de 2025, que autoriza o uso da Bíblia Sagrada como material de apoio complementar nas escolas públicas e privadas de Feira de Santana.

A medida é um ataque a laicidade do Estado, assegurada no Art. 19 da Constituição Federal, que proíbe qualquer vínculo ou privilégio religioso por parte do poder público. Ao institucionalizar o uso de um livro religioso específico em ambiente escolar, a gestão municipal viola a neutralidade e fere o direito de estudantes e profissionais à liberdade de crença e de não crença.

A escola deve continuar sendo um espaço de respeito e diversidade. A imposição de um único símbolo religioso invisibiliza outras tradições de fé, além de marginalizar estudantes e profissionais agnósticos, ateus ou pertencentes a religiões de matriz africana e indígena, já historicamente perseguidas e discriminadas. Defender um Estado laico é garantir que todas as expressões de fé, ou a ausência delas, coexistam sem imposição ou doutrinação.

Segundo dados do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, em 2024 os casos de intolerância religiosa cresceram mais de 80%, com destaque para os ataques às religiões de matriz africana, e a aprovação dessa Lei em Feira de Santana simboliza retrocesso e avanço do fundamentalismo religioso nas políticas públicas municipais.

A APLB Feira reafirma sua defesa da educação laica e democrática, construída sobre o respeito à diversidade, à ciência e ao pensamento crítico. Reitera, ainda, que a luta sindical é também contra o obscurantismo e a tentativa de instrumentalizar a educação para fins religiosos ou políticos. Exigimos que o poder público revogue a Lei nº 4.353/25 a fim de garantir uma educação pública que valorize o conhecimento, a liberdade e a inclusão, princípios indispensáveis para a formação de uma sociedade democrática e plural.

Feira de Santana, 12 de novembro de 2025.
A Direção da APLB Feira.

Nota da Adufs contra a sanção da Lei que autoriza utilização da Bíblia em escolas de Feira de Santana

A Diretoria da Associação das e dos Docentes da UEFS (Adufs), por meio do Grupo de Trabalho de Política de Classe para Questões Étnico-Raciais, de Gênero e Diversidade Sexual (GTPCEGDS), vem a público manifestar seu total repúdio contra a sanção da Lei 4.353/2025, que dispõe sobre o uso da Bíblia Sagrada como material de apoio complementar nas escolas públicas e privadas do município de Feira de Santana, ocorrida no dia 10 de novembro de 2025.

A nova legislação representa um grave ataque à laicidade do Estado, presente na Constituição de 1988, em seu artigo 19, em que é exigida imparcialidade religiosa nas instituições públicas, impedindo que qualquer credo seja oficializado ou promovido pelo poder público.

A institucionalização de uma ferramenta religiosa como recurso didático vai de encontro a todos os processos pedagógicos que têm sido desenvolvidos por profissionais da educação empenhadas(os) em fazer do campo educacional um espaço contemplativo da diversidade. Na Lei, fica evidente o potencial excludente para pessoas que não comungam da mesma crença, são agnósticas ou são ateias.

No mês em que celebramos as contribuições da população negra na construção da identidade nacional, é importante destacar ainda que a disseminação de ideais do cristianismo remonta e reforça um cenário de perseguição a outras formas de expressão religiosas, sobretudo, aquelas de matrizes africanas e afrobrasileiras que, historicamente, são estereotipadas, marginalizadas e perseguidas a partir de interpretações equivocadas e criminosas acerca dessas religiões e suas(seus) adeptas(os).

Dados do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), coletados no ano de 2024, mostram que a intolerância religiosa no Brasil cresceu mais de 80%. Crenças de matriz africana representam o maior número de ocorrências, tendo São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia como os estados com mais casos.

Se por um lado a sanção da Lei escancara o retrocesso nas políticas educacionais, por outro, demarca o avanço do fundamentalismo religioso, que tem ocupado cada vez mais espaço nos debates públicos, nas instituições e na vida social, promovendo doutrinação, ódio e violência.

A Diretoria da Adufs e o GTPCEGDS da Seção Sindical consideram a aprovação da Lei um grave ataque às liberdades democráticas, que deve ser repudiado por quaisquer instituições comprometidas com a construção de uma educação pública, gratuita, de qualidade socialmente referenciada e laica, assim como determina a Constituição.

Lamentavelmente, mais uma vez vimos a público repudiar às políticas educacionais implementadas pelo município de Feira de Santana que ao longo de mais de duas décadas, tendo o mesmo grupo político dominante, vem promovendo sucateamento das instituições de ensino, ataques sucessivos às(aos) trabalhadoras(es) da educação e degradação de princípios basilares para a consolidação de uma educação realmente comprometida com valores democráticos inclusivos.

Feira de Santana, 12 de novembro de 2025.

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