Língua Portuguesa
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Nesta quarta-feira, dia 5 de novembro é celebrado nacionalmente do Dia da Língua Portuguesa. A data foi instituída em homenagem aos aniversário de Ruy Barbosa, escritor e jurista que teve importante destaque no país, além de grande defensor do idioma.

Para falar sobre os diversos aspectos que envolvem a comunicação utilizada no país através da linguagem, o Acorda Cidade conversou com o professor e pesquisador Eduardo Miranda. Ele é doutor em educação, pós-doutor em filosofia e pós-doutorando em Letras Estrangeiras, além de coordenar o Grupo de Pesquisa Corpo-território, Educação e Descolonialidade (CNPq/UEFS).

Eduardo Miranda, professor e pesquisador
Eduardo Miranda – Foto: Arquivo pessoal

Para o especialista, este dia serve principalmente para lembrar que é preciso ressignificar o formato da comunicação para que a linguagem seja efetiva em sua verdadeira função.

“Celebrar o Dia Nacional da Língua Portuguesa é celebrar uma língua que é viva, que precisa ser modificada e que ela precisa ser atualizada para o momento atual de 2025. Um momento onde a gente está buscando uma sociedade justa, democrática, igualitária e que respeite a diversidade e a diferença”

Ele explica que a língua falada no Brasil é herança da mistura de etnias, e portanto essa associação ao Português de Portugal pode ser perigosa quando se pensa em valorização da identidade nacional.

“Lélia Gonzalez, um intelectual negra, pensadora da sociedade brasileira, na década de 80, chamou a atenção que nós não falamos uma língua portuguesa oficial de Portugal, justamente pelo fato de que nós somos misturados em povos indígenas, que já existiam no Brasil antes da chegada das caravelas, se misturou com a língua portuguesa que o português trouxe para cá, a língua oficial do colonizador, e ainda tivemos as influências dos povos da diáspora africana. E hoje nós também continuamos a defender, que nós falamos ‘Pretoguês’, que é a mistura da contribuição dos povos negros, mais o vocabulário oficial do colonizador português”

Vocabulário regional

Brasil
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Além da mistura que se dá, desde a origem do idioma, um elemento característico da linguagem no Brasil é a regionalização. Processo em que palavras têm uso ou significado variável de região para região, tornando a língua portuguesa ainda mais rica. O professor Eduardo reforça que os dialetos de cada região precisam ser compreendidos como parte integrada à Língua Portuguesa, compondo toda a sua complexidade.

“Nós temos uma variação linguística no Brasil que tem uma representatividade muito específica de determinados territórios. O nordestino tem o seu vocabulário muito específico, sobretudo quando a gente faz uma comparação com a forma que o sudestino se comunica. Então, de fato, existe essa diferenciação variante regional, mas que a gente não pode perder a dimensão de que isso tudo representa e significa a língua portuguesa”

Redes sociais e a “nova linguagem”

Redes Sociais
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A escrita das palavras abreviadas se popularizou com o uso constante das redes sociais. Uma discussão recorrente é sobre os impactos que essa forma diferente de escrita podem, ou não causar na escrita formal.

O professor explica que a abreviação é fruto de um processo midiático quando se fala das redes sociais. Frutos de uma geração considerada por teóricos como sociedade líquida, a atualidade trouxe a comunicação mais rápida, efêmera e instantânea.

“A forma que a gente se comunica nas redes sociais, nas mensagens privadas, ela de fato tem uma característica de abreviação para tornar a comunicação mais fluida, mais rápida. Isso não significa que essa mesma pessoa que tem esse hábito de se comunicar no espaço informal de uma forma abreviada, não possa ter uma comunicação mais formal no momento que é solicitado isso para ela”

O professor Eduardo relata que já existem estudos a respeito, mas que ainda são prematuros. A questão inicial é aprender a separar as necessidades linguísticas de cada situação nesse processo educacional.

“Temos que saber diferenciar. Nós temos a comunicação formal para atender as regras da sociedade institucionalizada, e nós temos a comunicação informal, que é do cotidiano, que é do dia a dia, que abre espaço para as abreviações, mas que no final a gente consegue se comunicar, a gente consegue entender o que o outro está dizendo”

“A abreviação é uma forma também de comunicação e que atende uma normativa específica, que é a normativa da sociedade líquida, que precisa ser instantânea. Mas o sujeito que se comunique precisa ser avaliado por regras oficiais do português oficializado nos concursos, nas redações, na escolarização. Ele precisa atender a normativa e as regras que são institucionalizadas”

Em contrapartida, Eduardo traz também a perspectiva da utilização da Inteligência Artificial que vem suprimindo parte importante da utilização do intelecto humano. Ele ressalta que o mecanismo deve ser aliado, mas não deve tornar o conhecimento intelectual inutilizado.

“Os estudantes estão em um número significativo utilizando a inteligência artificial para se comunicar, sobretudo quando a gente está falando do meio acadêmico. Então, de fato, é o nosso maior desafio hoje, enquanto educadores e educadoras. Não é colocar a inteligência artificial como nosso inimigo, longe disso. Nós só temos que ter uma discussão na sociedade que o estudante e a sociedade em geral olhe para a inteligência artificial como um dispositivo que venha potencializar a construção cognitiva da gente, do estudante, dos pais, da família, e não como substituição da nossa forma de se expressar”

Estrangeirismos

Estrangeirismos
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A apropriação de palavras estrangeiras é um fenômeno linguístico cada vez mais frequente no Brasil. O processo, chamado de Estrangeirismo, integra a comunicação de algumas áreas profissionais, nas redes sociais, nas gírias e no mundo da tecnologia, por exemplo.

“Nós somos um país fruto de um processo de colonização, então, sempre o território brasileiro foi convidado a olhar para o exterior. A nossa primeira referência de língua foi a língua externa ao território nacional que nós temos hoje. O povo originário daqui não falava a língua portuguesa. Qual foi a primeira referência de comunicação da gente oficial? O português de Portugal”, explica Eduardo.

O estudioso pontua que com o passar dos séculos, o inglês, sobretudo o norte-americano prevaleceu com uma comunicação que se classifica como oficial e que liga todos os países no processo de globalização. Com a construção do Brasil, olhando para fora, o uso das palavras estrangeiras substituindo palavras originárias do vocabulário se potencializou.

“Isso é perigoso, porque provoca um processo que a gente chama de epistemicídio vocabular. Então a gente deixa de se comunicar numa linguagem que é mais próxima da nossa realidade, do nosso legado oficial e cultural, para atender uma comunicação de um processo exterior ao nosso, para poder situar ou sentir pertencente a uma aldeia global”

Democratização da comunicação

comunicação democrática
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O pesquisador pontua também que enxerga a linguagem como um organismo vivo, portanto, por ser vivo ainda está em constante construção, e esse processo vai acontecendo com a globalização, e com a visibilidade das minorias.

“A gente pode perceber que a língua portuguesa, ela não consegue dar conta de todas as necessidades, tanto que nós temos a Libras, que é a língua de sinais oficial do Brasil, uma outra forma de comunicação. Então, a gente percebe que a própria língua portuguesa, ela não consegue dar conta das necessidades e especificidades das pessoas surdas, e foi necessário que o Brasil criasse uma outra língua justamente para ampliar a possibilidade de comunicação das pessoas”

“A língua portuguesa, ela evolui ao longo das décadas justamente para combater, nesse cenário, para combater qualquer tipo de opressão e de discriminação”, completa o professor e pesquisador Eduardo Miranda.

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