Vivemos um tempo em que ouvir o outro parece exigir mais esforço do que nunca, e a convivência parece cada vez mais difícil. O ritmo acelerado das rotinas, o excesso de informações e o bombardeio de opiniões nas redes sociais têm reduzido nossa paciência e capacidade de escuta. E isso não é apenas impressão. De acordo com o relatório global “World Mental Health Day 2024“, divulgado pelo Instituto Ipsos em 2024, o Brasil é o quarto país mais estressado do mundo.
Por que estamos tão intolerantes? Para ajudar a responder essa pergunta complexa e atual, conversamos com a médica psiquiatra Luiza Soares para entender sobre as causas desse comportamento e as consequências para a humanidade.
Para a especialista, essa intolerância é consequência direta de um acúmulo de carga emocional e ao modo como a sociedade moderna lida com o tempo e as emoções. “A gente vive um mundo acelerado, uma sobrecarga emocional que diminui nossa capacidade de lidar com o outro. O diálogo deu lugar à reatividade emocional”, afirmou a psiquiatra ao Acorda Cidade.
Como consequência, segundo a especialista, essa aceleração constante tem enfraquecido a escuta e o diálogo, transformando facilmente qualquer divergência em embate. “É um ciclo que se perpetua: o conflito mal administrado gera tensão, ansiedade e novos conflitos”, afirma.
Reatividade e empobrecimento da empatia
A especialista descreve o que chama de empobrecimento da empatia, a perda gradual da capacidade de se colocar no lugar do outro. “A gente não para para escutar, a gente não para para refletir porque precisa de tempo”, diz. Essa falta de pausa, segundo Luiza, está no centro da intolerância atual.
Ela ainda lembra que os conflitos sempre fizeram parte da convivência humana, mas que hoje se tornaram mais destrutivos. “O conflito vai existir sempre, desde que o mundo é mundo, só que o conflito pode nos fazer crescer. A forma como você administra o seu conflito é que vai fazer a diferença. Essa perda da capacidade de parar para refletir, planejar, pensar no que vai fazer, no agir. É isso que faz com que os conflitos tragam tantos problemas para a gente”, afirma.
A comparação que adoece
As redes sociais, segundo a psiquiatra, ampliam esse quadro ao alimentar uma cultura de comparação e cobrança. “A competição maléfica de você se comparar com outro, de você não ver o seu potencial, se comparar com a vida que não existe. Essa competição é muito ruim”, alerta.
Ela ressalta que a exposição digital tem afetado principalmente os adolescentes, que vivem sob o peso de padrões irreais. “Nunca se viu tantas pessoas insatisfeitas consigo. Porque se comparam a imagens virtuais que não são reais, estão lá na rede social”, destacou.
Educar para refletir
Para a psiquiatra, enfrentar a intolerância exige educação emocional, algo que deve começar desde a infância. “Precisamos ensinar nossos filhos a conhecer os sentimentos. Frustração, tristeza e alegria fazem parte do que a gente é. Quando a gente entende o que sente, consegue reagir de forma consciente.”
A médica também defende o que chama de racionalizar a emoção, uma prática que ajuda a lidar melhor com os sentimentos, aprendendo a lidar com eles e usando-os de forma produtiva.
Por fim, Luiza Soares deixa uma reflexão: “Nosso grande desafio é desenvolver a escuta, desenvolver a paciência, a reflexão, olhar o outro. Então eu convido para essa reflexão, para doar a si mesmo um tempo, doar para o seu parente um tempo. É o que a gente precisa.”, finaliza.
Com informações do repórter Paulo José do Acorda Cidade
Reportagem escrita pelo estagiário de jornalismo Davi Cerqueira sob supervisão da jornalista Jaqueline Ferreira, ambos do Acorda Cidade
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