Bahia
Projeto do MP-BA que retira proteína animal da merenda escolar divide opiniões
'Escola Sustentável' foi implementado em março deste ano, em 160 escolas e creches das cidades de Biritinga, Serrinha, Barrocas e Teofilândia, no sertão da Bahia.
09/10/2018 às 11h43, Por Kaio Vinícius
Acorda Cidade
Implementado em março de 2018 em 160 escolas e creches das cidades de Biritinga, Serrinha, Barrocas e Teofilândia, no sertão baiano, um projeto do Ministério Público da Bahia que aos poucos está retirando a proteína animal da merenda escolar divide a opinião dos especialistas.
A previsão é de que até o final de 2019, 100% do cardápio da merenda escolar nestas cidades estejam sem proteína animal. Ao todo, cerca de 30 mil alunos são afetados pela mudança, que retira especialmente a carne, o leite e os ovos da merenda.
De acordo com a promotora de justiça Letícia Baird, idealizadora do projeto, o "Escola Sustentável" foi pensado após um levantamento sobre a qualidade da merenda ter encontrado muitos casos de desnutrição, obesidade e alergias, além de mau uso do dinheiro público na compra dos alimentos.
“Muito açúcar, biscoitos, achocolatado, rosquinhas, muitas carnes processadas, como sardinha, charque, alimentos processados e com pouca utilização dos itens que são considerados obrigatórios, previstos expressamente pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar, que são frutas e hortaliças”.
A nutricionista Camila Almeida, que foi uma das consultoras do MP-BA para implementar o projeto, diz que a alimentação baseada em vegetais garante todos os nutrientes que as crianças precisam.
“A proposta de se fazer isso, utilizando uma dieta baseada em vegetais, vem de todo um cunho científico que nos dá terreno para a gente ter certeza da segurança da alimentação baseada em vegetais”.
No Centro Educacional Dom Bosco, na cidade de Biritinga, uma das mudanças no cardápio foi no tradicional baião de dois, que leva arroz e feijão. Antes do projeto, o prato vinha acompanhado de charque, mas agora é servido com farofa de flocos de milho e soja.
Os alunos aprovaram. "Muito gostosa e saudável", diz uma aluna do Dom Bosco. Uma coleguinha concorda e acrescenta: "Porque tem verduras e legumes".
A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), entretanto, questiona a medida. Para a nutróloga Junaura Barreto, integrante da SPB, a exclusão da proteína animal da merenda escolar é preocupante.
“Nos preocupa a exclusão de um grupo alimentar tão importante, como a proteína animal, que vai ser fonte de ferro, vai ser fonte de zinco, vai ser fonte de cálcio na alimentação de crianças de uma população carente, do sertão".
Para a especialista, a condição social dos alunos deveria ser levada em conta na implementação do projeto.
"A gente vive num país em que tem prevalência de anemia por carência de ferro de mais de 50%. E essas crianças vão às escolas, na maioria das vezes, tendo como refeição principal a merenda escolar. A gente concorda que precisa de correção [na merenda]. O que nos preocupa é a deficiência nesses dois anos, da exclusão total de um grupo alimentar tão importante”.
Junaura destaca ainda que a deficiência de nutrientes encontrados nos alimentos de origem animal podem acarretar em problemas cognitivos.
“A carência de ferro traz repercussões cognitivas importantes, inclusive dificuldades de aprendizado, e algumas repercussões que são irreversíveis. Têm estudos mostrando que crianças que tiveram anemia por deficiência de ferro têm alterações em níveis cerebrais que são irreversíveis, e levam para a vida adulta. Então, são adultos que terão deficiências cognitivas de alguma forma”, afirma.
Com relação às justificativas do MP-BA para implementação do "Escola Sustentável", como obesidade e desnutrição das crianças, Junaura diz que outros fatores também influenciam nesses problemas.
“Nós sabemos que existem dificuldades na gestão e na seleção destes nutrientes na merenda escolar de um modo geral, mas a prevenção da obesidade vem muito mais do incentivo ao aleitamento materno, e o próprio leite materno é uma proteína animal, mas uma proteína espécie específica. Essas crianças que estão na escola não estão mais mamando, elas não têm a fonte proteica da mãe, elas têm a fonte proteica externa", diz. "
Na criança menor de cinco anos de idade, a prevalência no nosso país de anemia ferropriva, de deficiência de vitamina A, deficiência de zinco – que interfere no crescimento e na imunidade, nas defesas contra infecções-, ainda é significativa. Então, a restrição de grupos alimentares que são fonte destes nutrientes nos preocupa”.
Fonte: G1
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