Feira de Santana

Advogados de Feira de Santana divergem sobre nova regra da OAB que proíbe a ostentação nas redes sociais

De acordo com o artigo 6º do provimento, fica vedada, na publicidade ativa, qualquer informação relativa às dimensões, qualidades ou estrutura física do escritório, assim como a menção à promessa de resultados ou a utilização de casos concretos para oferta de atuação profissional.

29/09/2021 às 08h12, Por Laiane Cruz

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Laiane Cruz

Recentemente o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) publicou o novo Provimento 205/2021, que veda veementemente em seus artigos 6º e 7º a ostentação por advogados em suas redes sociais de bens materiais, como carros de luxo, viagens, qualidade e estrutura física de seus escritórios, associando-os ou não ao exercício da profissão.

De acordo com o artigo 6º do provimento, fica vedada, na publicidade ativa, qualquer informação relativa às dimensões, qualidades ou estrutura física do escritório, assim como a menção à promessa de resultados ou a utilização de casos concretos para oferta de atuação profissional.

Em parágrafo único, fica vedada em qualquer publicidade a ostentação de bens relativos ao exercício ou não da profissão, como uso de veículos, viagens, hospedagens e bens de consumo, bem como a menção à promessa de resultados ou a utilização de casos concretos para oferta de atuação profissional.

Já o artigo 7º diz que ‘considerando que é indispensável a preservação do prestígio da advocacia, as normas estabelecidas neste provimento também se aplicam à divulgação de conteúdos que, apesar de não se relacionarem com o exercício da advocacia, possam atingir a reputação da classe à qual o profissional pertence.

Em Feira de Santana, as novas regras da OAB também vêm dividindo as opiniões entre os profissionais da advocacia. Alguns acreditam que o novo Código de Ética fere a liberdade individual dos advogados, que têm o direito de postar o que desejarem em suas redes sociais. Outros veem a decisão como acertada, para coibir os excessos por parte daqueles que alcançaram riquezas e querem associar isso ao sucesso da profissão.

Entre os que concordam com a nova regra da OAB está o advogado Ronaldo Mendes. Para ele, o profissional de advocacia deve evitar qualquer tipo de ostentação nas redes sociais, sobretudo em virtude da crise provocada pela pandemia de covid-19.

Foto: Paulo José/ Acorda Cidade

“Quero crer que isso tem muito a ver com o momento que estamos passando de insensibilidade e comportamentos inoportunos. Independente de ser advogado, penso que qualquer profissional liberal, que lida com pessoas, que vive esse momento atual tão difícil, não deve ostentar nas redes sociais carrões, joias, roupas caras, quando há tanta gente próxima passando necessidade extrema, passando fome, incompreensão dos seus processos que não andam, que têm uma dificuldade pela quantidade de ações que tramitam e pouquíssimos servidores, um caos instalado de anos”, opinou.

Ele justificou seu pensamento acrescentando que atualmente a maioria tem acesso às redes sociais e observar tais comportamentos pode levar à ansiedade e depressão, por parte daqueles que não têm a mesma oportunidade da ganhos financeiros.

“Todo mundo tem acesso hoje, busca, visualiza, encontra lá um profissional ostentando uma riqueza que muitas vezes nem possui. Isso cria angústia, leva a depressão, sofrimento psicológico, então entendo que é muito oportuno que a Ordem dos Advogados tenha pensado nesse viés, e quero crer que seja por isso, para otimizar, para mostrar que a vida é muito mais do que aparência, que deve ser pensada como a essência de todos e não de alguns. Eu acho que essa regra sobre a exposição excessiva é bastante feliz e oportuna, e é também de foro íntimo e de sensibilidade de cada um, não se exibir para não gerar ansiedade no outro, frustração no outro, quando há tantos, seja lá qual for o profissional, com tanta dificuldade experimentada nesse momento de pandemia, que estamos atravessando.”

Ronaldo Mendes acredita ainda que é lamentável que os profissionais da área recebam esse tipo de recomendação.

“É lamentável que tenhamos que ser recomendados como sociedade a não exibir aquilo que não deve ser motivo de exibição. Se alguém prosperou, conseguiu uma posição de destaque, de ganho de capital, deve ser o mais discreto possível, porque nem todos possuem a mesma sorte. A vida deve ser partilhada nos bons sentimentos, e não por aquilo que se tem, porque é muito pequeno viver assim”, disse.

Interpretação

Já a advogada Flávia Pacheco observa que os artigos que tratam sobre ostentação no novo provimento o fazem de maneira muito subjetiva e dá margem a várias interpretações.

Foto: Arquivo Pessoal

“Em relação à nova regra, era necessário, imperioso a modernização do provimento, que trata sobre os limites da publicidade na advocacia, porque necessitava se adequar à nossa situação atual. E nós advogados já somos familiarizados com regras, leis, desde o momento da nossa formação. Mas o provimento traz um conceito aberto e muito subjetivo, fala no artigo 6º sobre a questão da publicidade ativa, embora no preâmbulo ele explique sobre essa publicidade ativa, que é aquela capaz de atingir um número indeterminado de pessoas, ele não diz o que seria no caso o termo ‘ostentação’. O que é ostentação para mim, pode não ser para o outro. Então é um conceito aberto, subjetivo, e no meu ponto de vista a maior celeuma em relação a isso é porque é necessário que se defina em regras, em leis, tudo de uma forma bastante objetiva. Lá tem apenas a palavra ostentação e que eu não vejo como uma palavra adequada para estar em uma lei, um provimento da advocacia”, criticou.

Além disso, na opinião de Flávia Pacheco, existem atualmente outras questões mais sérias e urgentes com as quais a OAB deveria se debruçar.

“A advocacia não recebeu o provimento com bons olhos, tanto que a celeuma que se gerou dentro da classe está repercutindo na sociedade. Tomou uma proporção grande. Não existe definição clara da regra. Tem tanto assunto mais importante nesse momento para a OAB se manifestar, como por exemplo o enfrentamento à crise do poder judiciário, as medidas necessárias e efetivas para reabertura dos fóruns, a situação que a advocacia vem passando em função dessa crise com a pandemia, de tantos advogados fechando seus escritórios, e a OAB vem se manifestar sobre o que advogados vem postando em suas redes sociais. É necessário que se parta para enfrentar o que é mais importante, que nesse momento é o seu direito de exercer a sua profissão”, defendeu.

O presidente da OAB, seccional de Feira de Santana, Rafael Pitombo, lembrou que o Código de Ética da entidade tem uma previsão de publicidade, mas ainda bastante tímida, que esse código era de 95 e existia um anseio da classe de reformulação para tentar atender à realidade atual.

Foto: Ney Silva/ Acorda Cidade

“As redes sociais estão aí, e os advogados têm que usar essa ferramenta de divulgação do seu trabalho. O que a OAB entende que não é o correto é o advogado estar ostentando nas redes sociais carros, aviões, helicópteros, casas, de forma vinculada à profissão, porque a OAB é contra a mercantilização da profissão”, destacou.

Rafael Pitombo afirmou que a classe ficou surpresa com a divulgação da nova regra, que interfere diretamente na vida privada dos advogados e no seu direito de expressão.

“No provimento, a parte da publicidade como um todo já vinha sendo discutida, os advogados querendo uma modernização, adaptação ao momento atual, porém a classe foi pega de surpresa com relação a essa questão da ostentação, que traz vedação da ostentação também na vida privada dos advogados e eu não concordo tanto porque invade a esfera da liberdade individual de cada um. A pessoa que conquistou seus bens tem o direito de viajar, de mostrar o seu carro, sua casa, isso aí é da particularidade de cada um, talvez o que não seja o ideal é vincular isso à profissão, como se a advocacia levasse a alcançar esses bens materiais, que a gente sabe que não é a realidade prática de todos”, pontuou.

O presidente da seccional de Feira também apontou outras questões como mais urgentes nesse momento, como a reabertura dos fóruns.

“Muitos colegas questionaram essa modificação com relação à ostentação pela invasão da liberdade de cada um. Eu acho que deve ter sim um bom senso e limite com a mercantilização da profissão, e muitos colegas ficaram chateados por conta do momento que a gente vem de pandemia, passando por sérias dificuldades e a advocacia vem sofrendo bastante. A gente entende que o conselho federal deveria se debruçar em outros temas, como, por exemplo, a reabertura dos fóruns, que em todo o Brasil via de regra estão com as portas fechadas.”

Pitombo reconhece que muitos colegas publicam fotos mostrando bens e uma vida de luxo nas redes sociais e criticou quem associa a riqueza ao ideal da profissão de advogado.

“Em todos os estados do Brasil a gente vê colegas postando carros de luxo, aviões, viagens ao exterior, mansões, helicópteros, muitos vinculando isso ao exercício profissional. E creio que é isso que a OAB quer controlar, com relação à mercantilização da profissão. Eu acho que tem que ter um limite, inclusive para não trazer para o jovem advogado que o ideal da advocacia de sucesso é tão somente os bens materiais, porque isso não é a realidade da maioria. Mas eu acho que o provimento pecou só nessa invasão da liberdade individual de cada colega, que tem o direito de postar o que achar pertinente.”

Em Feira de Santana, segundo Rafael Pitombo, há comissões de fiscalização do exercício profissional, e se um profissional da área infringir o código de ética pode ser denunciado através dessas comissões, que encaminham a denúncia ao Tribunal de Ética da OAB, e o advogado poderá ser julgado, processado, e sofrer as punições de advertência, como também a suspensão da carteira.

A advogada e defensora dos direitos na perspectiva da igualdade de gênero e racial, Lorena Aguiar, também comentou sobre a nova determinação da OAB. Para ela o provimento complementa o que já é previsto no Código de Ética sobre a publicidade profissional.

Foto: Arquivo Pessoal/ Advogada Lorena Aguiar, à direita

“Segundo essas normas, a publicidade deve ter caráter meramente informativo, deve ser discreta, sóbria, de acordo com o caráter da advocacia, que é um serviço público e cumpre uma função social e é imcompátivel com qualquer tipo de conteúdo que possa configurar captação desleal e concorrência de clientela.”

 

Com informações do repórter Ed Santos e da jornalista Maylla Nunes do Acorda Cidade. 

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