Feira de Santana

Com média de 30 partos por dia, Hospital da Mulher continua enfrentando superlotação

Em entrevista ao Acorda Cidade, a presidente da Fundação Hospitalar Gilbert Lucas, explicou as dificuldades para atender a demanda da região.

17/01/2020 às 14h17, Por Brenda Filho

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Orisa Gomes

Com uma média de 30 partos por dia, o Hospital da Mulher de Feira de Santana continua enfrentando problemas de superlotação. Em entrevista ao Acorda Cidade, a presidente da Fundação Hospitalar Gilbert Lucas, explicou as dificuldades para atender a demanda da região, já que muito municípios não respeitam os critérios da pactuação. Mesmo com a existência de 120 leitos e um orçamento de cerca de R$ 64 milhões para todo o complexo hospitalar, as dificuldades são muitas. Veja na entrevista abaixo. Ela começa falando da abrangência da Fundação Hospitalar. Leia na íntegra:

Foto: Orisa Gomes/Acorda Cidade

Acorda Cidade – A Fundação Hospitalar compreende quais as unidades?

Gilbert Lucas – Existem muitas duvidas da população na questão da Fundação Hospital a nível de gestão. Hoje a Fundação Hospitalar gerencia a parte toda de especialidades. Temos todo o complexo maternidade infantil, que a gente chama de Hospital da Mulher, tem a parte ambulatorial do hospital da criança. A parte toda do hospital da criança a gente transformou na parte ambulatorial que virou um complexo materno-infantil. Tem a parte também do laboratório, onde a gente atende não só as pacientes internadas, mas toda a rede do município. A gente ampliou em 2019 e hoje a gente tem também toda a parte de especialidade nos atendimentos de anemia falciforme. Tem a parte do Centro Municipal de Prevenção ao Câncer (CMPC), que compreende a fundação e o Centro Municipal de Diagnóstico por Imagem (CMDI). Todos esses atendimentos em especialidade que também inclui a parte do ambulatório e não só da parte médica, mas fisioterapia, fonoaudiologia, planejamento familiar, que é o DIU (método contraceptivo), a parte do climatério, pré-natal de alto risco, que temos 3 profissionais que atendem.

AC – Quais são os números que a senhora apresenta?

GL – A gente fez um analise histórica, de 2013 a 2019, em todo o complexo da Fundação Hospitalar. A gente tem dados importantes como o da parte de emergência do Hospital da Mulher. Em 2013, tivemos 18.385 gestantes atendidas na emergência e 7.805 internamentos. Esses atendimentos são de parto ou curetagem, que são os atendimentos que a gente faz hoje na parte de emergência no Hospital da Mulher. Já em 2019, pulamos em atendimento para 44.814 gestantes atendidas na emergência e 10.713 internamentos para partos. Aí você fala assim: “Por que é tão expressivo esse aumento?” Nós temos vários requisitos. A questão da implantação de novos leitos, implantamos a enfermaria D, com 14 leitos; aumentamos a mãe canguru para 14 leitos que eram só 6, tivemos um aumento também na parte do centro cirúrgico, era uma sala, hoje a gente tem três salas de cirurgia. Aumentamos os pré-partos que eram 4 e hoje são 8, implantamos o parto humanizado que hoje são enfermeiras obstetras que também realizam. Ainda em 2018 abrimos a emergência “classificação de risco” que são enfermeiras obstetras que fazem aquele primeiro atendimento, o que ajuda bastante, e hoje também temos a equipe técnica, a equipe médica. Em 2013 eram dois obstetras 24h e hoje são quatro obstetras 24h, dois anestesistas 24h e 3 pediatras 24h. Implantamos e credenciamos a residência médica em obstetrícia e ginecologia. Esse fluxo de atendimentos, esses protocolos novos ajudaram a gente a conseguir fazer esse maior atendimento, dar uma assistência melhor e atender a uma demanda maior.

AC – Por que o Hospital da Mulher está sempre superlotado?

GL – Primeiramente, é importante frisar que não é uma unidade que atende somente Feira de Santana e sim toda a região. Hoje, o Hospital da Mulher é uma porta aberta de emergência. Quando você fala porta aberta de emergência, a gente sabe que a realidade hoje no problema de obstetrícia não é só de Feira ou Bahia, é o Brasil inteiro. Se você for fazer uma analise no Brasil, a maioria das unidades que tinham santas casas, que tinham leitos credenciados em obstetrícia fecharam e hospitais particulares que tinham obstetrícias credenciados pelo SUS também fecharam pela questão dos valores. Hoje, um parto pelo SUS de baixo risco é na faixa de R$ 540,00 com tudo incluso, médico, anestesista, é o pacote. Aí você tem um acompanhante que é direito e o acompanhante tem 6 alimentações junto com a gestante. Você tem fonoaudiologia, tem que ter berçário de médio risco, fisioterapia, toda uma assistência. Hoje, é muito difícil um município da região, principalmente aqueles municípios que tem um hospital municipal mas que não faz nem um parto normal e por eles não terem essa equipe técnica para fazer esse parto, então é muito mais simples colocar a gestante da ambulância e mandar para Feira de Santana, pois sabem que vai ter toda a assistência. Esses hospitais não tem uma estrutura de sala de parto, centro obstétrico, pediatra na sala de parto, precisa ter todo um complexo para fazer esse atendimento.

AC – O serviço é todo pactuado?

GL – Não. A gente tem uma parte ainda que é própria do município. O Hospital é municipal, a fonte da gestão hoje para manter o hospital vem de duas fontes: SUS, que está na média de 25% e o restante que o recurso próprio da Prefeitura de Feira de Santana que faz a transferência para a Fundação.

AC – Qual é o custo desse Hospital?

GL – A gente pode dizer o orçamento para manter a Fundação Hospitalar em 2020 é de R$ 64 milhões; uma média de R$ 5 milhões por mês.

AC – São quantos partos por dia?

GL – Em 2020, começamos janeiro com uma média de 30 partos por dia. Entre 25 a 30, dependendo do dia. Tem uma demanda expressivamente grande. É importante a gente colocar que o Hospital da Mulher possui 120 leitos. Mas também é importante frisar que obstetrícia você não tem uma rotatividade 120 leitos/dia, porque muitas vezes você tem um protocolo. A cesárea é de até 72h para alta e parto normal, até 48h. A gente implantou agora pediatria via ambulatório para aqueles partos normais que a gente consegue liberar em até 24h e já garante um retorno dessa criança via ambulatório, para evitar que ela volte via emergência. Talvez um problema respiratório, a gente tem muito isso. As vezes a criança nasce com sífilis, tem que tomar antibiótico junto com a mãe. Por exemplo, as vezes a gente fica com um recém nascido na UTI neonatal dois, três meses, esperando a regulação, como a gente teve um caso agora de um cardiopata. Uma faleceu e outra conseguiu transferir. Esse é um problema grande, a parte de alto complexidade na questão de recém-nascidos principalmente na parte de cardiopatia e neurocirurgia. A gente possui no Hospital da Mulher, 11 leitos de casa da puérpera, que é quando o bebê vai para a UTI neonatal e é um direito da mãe ficar na unidade mesmo tendo alta, mas ela fica na unidade acompanhando o bebê. É um local como se fosse a residência dela, com alimentação, principalmente aquelas mães que não têm condições de vir e voltar todo dia para fazer a visita do seu filho na UTI neonatal. Tudo isso é um custo. A gente tem uma rotatividade de 35 a 40 leitos por dia. Diariamente a gente tem uma taxa de 100% de ocupação de todos os leitos, tanto UTI, quanto berçário, Mãe Canguru, casa da puérpera. A gente tem uma média de 11 gestantes extra leito todos os dias. O extra leito são aquelas gestantes que ficam no pré-parto internadas enquanto leva alta nas enfermarias, não tem vagas na enfermaria elas ficam no extra leito. A gente sabe que o complexo materno-infantil do Hospital da Mulher é muito importante para Feira de Santana e região. É um hospital municipal que tem o apoio da Prefeitura de Feira e que sem apoio não conseguiria manter o hospital, só com a produção do SUS, porque a gente sabe que o custo é alto e se fizer uma média do valor que o SUS repassa para um parto e um parto particular a diferença é enorme. Um parto pelo SUS é R$ 540,00 e particular está numa média de R$ 5mil. É importante frisar que o Hospital da Mulher não é credenciado para a cirurgia pediátrica. Por isso que a gente não faz esses tipos de cirurgias. Infelizmente a gente ainda aguarda a regulação. Existem cirurgias como a cardiopatia, a neuro pediatria que não faz nem no Hospital Estadual da Criança. Essas cirurgias fazem só em algumas unidades de especialidades em Salvador, como o Hospital Ana Nery, martagão Gesteira. São casos específicos em que a gente não é credenciado para fazer esses tipos de cirurgias.

AC – E quanto ao parto humanizado?

GL – O parto humanizado foi implantado no final de 2018 para 2019, por enfermeiras obstetras. A gente vem fazendo curso com gestantes e está sendo importante para dar toda a assistência. A gente faz uma vez ao mês, são 40 vagas em que as gestantes participam e conhecem toda a estrutura do Hospital e conhecem o que é o parto normal. Isso é importante para a parte educativa, que as vezes a gente sabe que a gestante prefere cesárea, mas não conhece os benefícios do parto normal.

AC – Por que é porta aberta para vários municípios?

GL – Existe pactuação. A gente tem essa pactuação com 70 municípios, mas é sempre bem definida na questão de quantidade de que cada município tem o direito de encaminhar as gestantes, por isso que existe a regulação. O que acontece é que a gente acaba entendendo que é um hospital de especialidade porta aberta de emergência obstetrícia e as gestantes acabam vindo as vezes até por conta própria. Obstetrícia você não pode aguardar um parto cesáreo, a criança vai morrer de suprimento fetal, então você tem como aguardar uma regulação. Em tom de desespero, as vezes também dos familiares, acabam encaminhando a gestante em carro próprio de outros municípios. A gente vem observando muito que as gestantes que moram nos municípios da região, quando dá o 7º mês de gestação, elas se mudam para Feira de Santana, para casa de um conhecido, dá entrada no Hospital com o comprovante de endereço dessa residência e agente só vem descobrir que é de outra cidade, quando a gente vê o inicio do cartão pré-natal. Isso acontece muito. Por ser um hospital de porta aberta, a gente não tem como negar atendimento, porque se não vai virar notícia que a gestante ganhou bebê na porta do hospital, a criança foi a óbito, tem toda essa situação em que existem critérios. Os médicos que são plantonistas respondem por não atender uma questão de uma gestante chegar com sangramento, hipertensão… Eles não têm que deixar de atender, fechar as portas por ser uma unidade de referência e dizer que não atende, porque o município pactuou 50 e já foram 60. O que a gente tem que fazer em relação aos municípios, o prefeito Colbert (Martins) já fez que foi solicitar os documentos e encaminhamos cópia para o Ministério Público mostrando que municípios encaminham gestantes sem regulação, então o Ministério vai notificar esses municípios, para que os gestores consigam se adequar, principalmente quem tenha hospital e possa adequar pelo menos um parto normal.

AC – Tem o passante também né. Que está de férias e tem o trabalho de parto em passagem por Feira, como aconteceu recentemente o caso da gestante de Osasco?

GL – Isso, estava na rodovia, teve um trabalho de parto e o bebê nasceu em Feira de Santana. São situações em que agente tem que apertar a prefeitura para que se adequem aos trabalhos de partos com profissionais de qualidade. 

Colaborou a estagiária de jornalismo Mayla Nunes.

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